terça-feira, 12 de maio de 2015

| Edmar Conceição |

28 de março de 2015


Olhando o tempo







Não me perturba o envelhecimento dos números na carteira de identidade, todavia, véspera de aniversário sempre me deixa inquieto, talvez por que a ventania do tempo fica mais perto de nós, assanhando os ponteiros de nossa alma, despertando silhuetas cada vez mais distantes.

 Em nossa viagem a Portugal, meu compadre e amigo Marcos Cesário presenteou-me uma bela fotografia que se encontra emoldurada na minha biblioteca. Interessante, a arte é mesmo atemporal, nunca me senti tão dentro desta imagem, mirando a Torre do Tempo e tentando se proteger em vão.

Escrevo esta crônica ouvindo uma bela canção portuguesa, escrita por Carlos Carranca, dizendo-me que “era uma vez... só uma vez aquela idade”.

Lembro-me de um passeio com o poeta Antônio Franco nas ruas estreitas de Coimbra, nosso deslumbre com os andares dos prédios antigos, o charme das varandas de madeira e de ferro forjado, tão próximas, imaginando o passado de uma intimidade nas alturas: os fuxicos, as juras de amor, intrigas ou olhares demorados. No final, lamentamos o silêncio e o vazio das janelas, do outrora que se foi.

Confesso que sinto o desconforto da pressa do tempo, desfolhando muitas quimeras. No entanto, acho que não nasci no outono em vão e ainda percebo um olhar menino na fotografia, apesar do excesso de agasalho.

Acredito que o nosso espírito é parecido com os belos Ipês, permitindo que a fúria do vento lhe deixe nu para que possa florir. Isso mesmo, os ponteiros do tempo não são lâminas milimétricas, pelo contrário, são um simples alerta, anunciando que os dias não servem para contar, mas que a brevidade das flores e das horas exige entrega e delicadeza.

Acho que, mesmo na timidez, olhar o tempo com encanto é um bom começo...