terça-feira, 9 de dezembro de 2014

| Edmar Conceição |










- Gostei mesmo do Escrítica, primo! Quando puder me coloca também em tuas crônicas, pode ser qualquer coisa. Não se esquece de mim não, primo! Um abraço!
Confesso que ri, nas primeiras leituras, quando recebi o e-mail do meu primo do litoral. No entanto, coube ao tempo, como na maioria das vezes, dar mais seriedade ao recado virtual.

Peço-te paciência, a escrita é como se fosse um canteiro de feitiços, é preciso um pouco de espera, inquietude e delicadeza para florescer um aroma que fisgue. Não sei se serve de consolo, mas dedicarei esta crônica a ti e a uma imensidão de coisas que me pedem, quase todos os dias, para não esquecê-las, para que deixem de ser um sopro imaterial e ganhem cor e timbre na fantasia da escrita.

Nesta manhã ouço um anjo cantar dentro dos meus silêncios, a bela voz de Mirusia Louwerse tem a precisão da alquimia das sereias, como se pudesse sorver o melhor de mim, emudecendo meu sopro e desenhando nos meus olhos uma garoa farta de um encanto que dói, seduz e liberta.

Ontem à noite, meu professor de Direito Penal discorria, com entusiasmo, o crime de tortura, anunciando que o crime se consume com o intenso sofrimento físico ou mental da vítima, devendo ser punido com o “rigor da lei”. E agora, primo, como posso denunciar esse canto transbordando tanta sofreguidão e beleza em mim, se são essas mesmas lágrimas que me açoitam a pescaria da poética.

Quando Emiliana Carvalho compartilhou comigo o vídeo de Mirusia Louwerse, citou Albert Camus: “a perfeição faz calar!”. Quero ainda, um dia, que minhas crônicas sigam o interlúdio celestial dessa bela moça. Quem sabe eu escreva a perfeição do entardecer, cerrando e colorindo o olhar de quem também se despede espalhando uma aquarela de melancolias e querências. Quem sabe eu escreva o pranto de um menino que rompeu com os ponteiros da madrugada e colhe seus poemas nas margens do sono de sua amada, acreditando, com devoção, no grito de cada verso, mesmo com a alma dolorida.

Talvez, primo, não possa atender a tua encomenda, o caminho da crônica deve ser o mesmo de um bilhete de amor lançado na agonia do mar, respirando o salitre do inesperado, qualquer pretensão prévia se afunda. Para que a perfeição faça calar é inútil querer dominar a escrita, mas, sim, ser dominado por ela, porque, como diz Fernando Pessoa, ela deve ser melhor do que nós.

Acredite, primo, não te esquecerei. Continue lendo o Escrítica, como diz Mário Quintana: “o poema é uma bola de cristal. Se apenas enxergares nele o teu nariz, não culpes o mágico”. Acho que a crônica deve ter a beleza de um caleidoscópio, ponho nela meus pedaços mais afiados e reluzentes. Quem sabe você se encontre em algum ponto do vitral que exponho toda semana e se permita o corte da palavra. Quem sabe, por fim, eu acerte na cadência da perfeição, permitindo que alguém fique como me encontro, neste momento, ouvindo o hino dos anjos, dilacerado e com uma bela passagem de luz.