terça-feira, 22 de julho de 2014

| João Manuel Ribeiro |

08 de julho de 2014




Na tenda invisível do riso

Trepei-te devagar à procura de figos e não encontrei
outro fruto senão os braços em derrame demorado,
moravas naquele tempo na tenda invisível do riso
como se os anjos te fizessem cócegas nas virilhas,
apanhavas o silêncio como quem retira a roupa do arame
sempre que alguém chegava de fora inesperadamente,
se a noite vinha depressa eu ficava no chão a olhar-te,
demorado  no voo das aves a debulhar os frutos,
tu despenteavas os cabelos – eu fazia o ninho.



Na húmil memória dos dias

trepei-te os braços dentro dos gestos bravios
como sismos depois soltei intempéries
nas mãos e dispus-me a morrer
na hemorragia aflita das palavras no poema

soubeste reescrever-me devagar no silêncio
caldeando planícies com outras lisuras
ressuscitaste-me na húmil memória dos dias
apetecendo-me despertar-te a nudez



Como dizer-te nesta página

o teu nome é a carne viva do poema
a navalha para aparar as palavras violentas
um leito tenro para as interjeições
como dizer-te nesta página se a pele
promete rumores e desalinhos maiores?

és um estigma doce aceso na palma da mão
uma tatuagem madura de desejo
a fugir de si e do corpo onde mor[r]o
adensado entre células e enigmas
ter-te é bálsamo de tão extensa dor